Adoção: Porque a conta não fecha?

no dia 22 de julho de 2014

Imagem daqui

Não é só entre as mães biológicas que existem divergências de opiniões quanto ao tipo de parto. No mundo das mães adotivas isso também é realidade. E claro, como em todo caso, quando não se sente a dor do outro, fica fácil julgar, apontar e excluir. 

O que quero abordar é o famoso "perfil restrito". Estou falando disso só hoje, mas há tempos percebo, leio e discuto com minhas amigas sobre. Perfil restrito são aquelas características que os pretendentes à adoção escolhem e que são consideradas dificultadoras dos mesmos serem chamados para adotar. Exemplo: Uma criança recém nascida, olhos azuis, sem irmãos. 
Usei a expressão entre aspas, pois trata-se de uma interpretação bem particular feita por cada profissional da área, cada um que entra na fila ou mesmo quem vem aqui me ler. 

Quando se pretende adotar uma criança, a motivação deve ser uma só: ter um filho. Caridade, meus amigos, se faz nos abrigos, na igreja, na rua, na chuva, na fazenda. Na fila de adoção não! Logo, se adotar não é caridade, não consigo compreender o julgamento imposto a quem acaso escolhe adotar um bebê e não uma criança já crescida. 

A primeira coisa que se deve ter em mente é: Adoção não é programa de governo para resolver o problema social de crianças abandonadas no Brasil. Dito isto, fica mais fácil entender todo o contexto. 

Não pensem que não é constrangedor chegar no Fórum e preencher uma ficha com o perfil da criança que queremos como filho, pois é sim. Nos sentimos de fato em um supermercado escolhendo algo. Por isso é necessário que o/os adotantes pensem muito sobre o que desejam e cheguem a um consenso sobre o que os fará felizes. Não adianta escolher um perfil bem diferente daquilo que ordena seu coração, na ansiedade do filho chegar logo (obrigada, Daniele, por me ajudar a entender isso). Claro, conheço inúmeros casos de sucesso de famílias que adotaram crianças com perfil bem diferente do que queriam no início do processo de adoção, mas isso foi um processo natural, um amor que surgiu com a convivência. Nunca, jamais mesmo, violente seu desejo por conta do que os outros vão pensar ou de medo de ficar anos na fila esperando.

Outra questão já bem sabida por muitos é que muitas crianças que chegam bebês nos abrigos acabam lá guardadinhas esperando trâmites processuais quase infinitos até que fiquem maiores e, por consequência, completamente fora do perfil que a maioria dos casais deseja. Eu sei do que estou falando, jamais faria uma afirmação destas de forma leviana. Um dos casos que mais me chocou até hoje foi o de três crianças que ficaram ONZE anos abrigadas aguardando um simples processo de destituição de poder familiar. Perderam a infância e parte da adolescência sem nunca terem tido a chance de conhecer candidatos a pais, pois, obviamente, não estavam disponíveis para adoção no cadastro nacional (CNA). A vida de voluntariado faz a gente se deparar com essas situações bizarras, verdadeiras aberrações. 

Diante disso, inocentemente ou de propósito mesmo, as pessoas acabam imputando a nós, os adotantes, que já sofremos tanto, o fato de nossos filhos demorarem, afinal, né, "ficamos querendo filhos recém nascidos enquanto tem tanta criança maior sobrando em abrigo". Eu tenho várias conhecidas que tem perfil bem amplo, que aceitam crianças maiores e mesmo assim ficam muito tempo na fila, pois os processos de destituição do poder familiar são demorados, eles andam de forma inversamente proporcional ao desejo/ansiedade dos candidatos a pais. Não é porque há abrigos cheios de crianças que estas estão disponíveis para adoção, mas este é um tópico que vou abordar em outra ocasião, pois tornaria o texto de hoje bem extenso.

Concluindo, não sou contra adoção tardia, isso nunca! E nem estou aqui para convencer ninguém a optar por um bebê e não uma criança maior ou adolescente. Mas sou contra julgamentos. E sou contra situações precipitadas que podem causar o que na minha opinião é a segunda maior tragédia na vida de uma criança abrigada: A devolução da mesma ao abrigo. A primeira, claro, é o primeiro abandono, o da família biológica.

O mundo da adoção de crianças já é tão sofrido, burocrático e cheio de injustiças que acho que as mães adotivas e profissionais na área tem mais é que se unir em torno de processos mais ágeis e esperas menos angustiantes e não começar a culpar uns aos outros por determinadas escolhas.  

Quer iniciar um processo de adoção ou tem curiosidade sobre? Eu escrevi esse post aqui:

- Pensa em adotar uma criança?



Boa terça feira!





9 comentários:

  1. Oi Clau que texto esclarecedor não sabia desta realidade...eu como leiga no assunto aprendi um bocado agora..obrigada

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  2. Muito boa a sua explanação. Sei que trabalha com isso e é conhecedora da realidade.
    Bjs e ótima semana.

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  3. Não entendo de leis o suficiente para debater o assunto, mas entendo de família o suficiente para dizer que este assunto precisa ser falado, esclarecido. É uma luta que todos precisaríamos abraçar para tornar os processos de adoção bem ágeis e menos sofridos para os envolvidos. Quanto mais informação, melhor.
    bjs

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  4. ðððTem muitas coisas para se pensar, sim há uma burocracia sem tamanho, mas também há aqueles que acham que adotar é simples, e não é... ou melhor, criar, educar os filhos não é tarefa fácil, sendo eles biológicos ou adotivos. Filho é filho e pronto, precisa de AMOR e LIMITES, e isso é tarefa de pais comprometidos. Não se devolve filho, se luta por ele, se derruba barreiras e preconceitos por ele, se enfrenta o mundo por ele. Penso que com AMOR, paciência e envolvimento é possível sim transformar a vida de uma criança que já passou por "poucas e boas" na vida. ðððððððððððððð

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  5. Clau, eu concordo com td no seu texto! Tem um grupo grande sobre adoção no face e toda vez que alguém comenta que o perfil é pra bebê aparecem umas pessoas pra dizer, vai cansar de esperar, vai passar anos na fila etc.E dai né??O que os outros tem com isso se essa é a vontade da pessoa?Meu perfil era restrito e eu nunca pensei em altera lo pra diminuir o tempo de espera.Esperei o tempo que precisou e valeu a pena cada minuto.Muito pior seria eu ter tentado uma adoção tardia, que eu sei que não estava preparada, pq é sim mais dificil, e depois me ver inclinada a devolver a criança.Pq isso sim, é uma coisa que nunca vou entender:devolução.Eu sabia dos meus limites, e os respeitei.Quem espera por um filho já passa por tanta situação dificil, e ainda tem que aguentar esse tipo de julgamento.Arrasou no texto amiga! Bj,Leidi

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  6. Adoção é tema que envolve tantas questões e que é tão maldosamente tratado pela mídia, né? Concordo com você, o sistema é burro, ineficaz, lento seria até um elogio. Quem já visitou abrigos, passa da dó a indignação em segundos. E até chegar a um abrigo, muitas crianças já sofreram coisas inimagináveis a mentes sadias. Os processos se arrastam porque ninguém de fato os reconhece como crianças. São raríssimos os profissionais que tem realmente interesse em mudar, em fazer algo, em trabalhar realmente pela adoção. Há um despreparo que chega a ser absurdo. Aliado a isso a pessoas querendo ser caridosas. Como bem disse a Astrid " eu não sou caridosa, eu queria apenas ter um filho". Falta informação, falta fiscalização, falta tudo. Enquanto isso, há um número enorme de crianças esquecidas pelo Estado e de candidatos a adoção destinados a esperar anos em filas obscuras e sem padrão de procedimento. O Cadastro Único é uma piada de mau gosto. Rezo todos os dias para que , apesar de tudo trabalhando para o contrário, famílias se formem. Excelente texto, Clau. bj.

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  7. Adorei como vc abordou o assunto.
    Realista e verdadeiro.
    Tb conheço o caso de 2 irmãs que já estão no abrigo há 13 anos, a mais velha já deve ter até saído pois acredito que já tenha completado 18 anos. Uma crueldade, pois a mãe biológica nunca deu atenção a elas e demorou mto pra destituir o patrio poder, infelizmente.
    Bjs

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  8. Olha Clau, eu como leiga tenho uma coisa comigo, filho biológico pode aparecer sem a pessoa querer, porque né ??
    Agora filho adotado (nem sei se é politicamente correto falar assim) é uma coisa totalmente diferente, quem quer,quer... e sabe o que quer.
    Não acho justo quando as pessoas julgam quem quer um bebê, e não uma criança maior... todo mundo quer um bebê, aquela fase cheirosinha, não acho justo privar uma "mãe" disso.
    Porque as leis não ajudam em nada, aliás só atrapalham... dificultam e faz milhares de crianças perderem a chance de ter um lar.

    Adoção é coisa séria e só cabe a quem vai adotar, ninguém tem direito de julgar.

    Bjus 1000 sua linda !!

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  9. A adoção é uma coisa muito complexa. Não sei como funcionam as leis nem como se julgam os critérios para os adotantes. Tenho dois sobrinhos adotados. Um foi registrado como nascido em casa. Se o bebê, um menino, não fosse adotado em dois dias iria para a Febem, com tanta gente na lista de espera. Minha irmã soube e apesar de nunca ter pensado em adotar uma criança (já tinha dois meninos pequenos e não queria mais filhos) foi lá e "ganhou" seu terceiro filho. A outra foi a mesma coisa, tudo igual. Meu irmão e minha cunhada resolveram que quando a criança nascesse seria deles. E foi, uma linda menina. Hoje estão com quase 30 anos e são profissionais bem resolvidos na vida.
    Mas tenho um casal de amigos que ficou quase 5 anos esperando uma criança, de preferência adoção tardia. Um belo dia ligaram pra eles avisando que a filha deles havia acabado de nascer e poderia ir para casa em 3 dias. É a Luísa que está com 7 meses. Vai entender?
    Bia Karasiak
    Florianópolis-SC

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